Thursday, June 28, 2012

Angola: Passado e Presente da Música de Resistência

A Sara Moreira escreveu este brilhante artigo para o website Global Voices Online. É um artigo que examina o papel da música nos movimentos reivindicativos de Angola, tanto no período ante-independência como agora. Lembrou-me um pouco de um post que escrevi no Lounge e que chamei "O Grito Político do Hip-Hop Lusófono". O artigo da Sara realça a repressão violenta sofrida pelo movimento que hoje reclama contra a permanência de Dos Santos no poder há mais de três décadas; movimento este cujas personagens mais proeminentes são músicos. É, por isso, inevitável a comparação que ela faz com o movimento musical dos anos 70 que foi fortemente reprimido pelas autoridades portuguesas. Sem mais rodeios:

Angola: Passado e Presente da Música de Resistência
Por Sara Moreira


No final de Maio de 2012, a Amnistia Internacional reportou [1] que com a proximidade das eleições em Angola, estava a haver uma escalada da repressão contra a liberdade de expressão no país, nomeadamente contra músicos de intervenção. O comunicado pedia a investigação exaustiva e imparcial de um ataque violento contra um grupo de activistas críticos do governo, que incluía o rapper “Hexplosivo Mental [2]“.

Duas semanas mais tarde, a 11 de Junho, outro rapper que não esconde a sua oposição aberta ao governo, Luaty Beirão, também conhecido por Ikonoklasta ou Brigadeiro Mata Frakuxz [3]foi preso [4] no aeroporto de Lisboa, por alegadamente transportar cocaína na sua bagagem.

Nas redes sociais são muitos que acreditam que a verdadeira motivação da prisão de #Ikonoklasta [5] é política, já que a sua voz dissidente é uma das que tem ganho mais visibilidade desde que o descontentamento com o governo do PresidenteJosé Eduardo dos Santos [6], há 33 anos no poder, passou a tomar mais frequentemente a forma de protestos nas ruas, e nos palcos de Luanda. Em Março de 2011, Luaty foi preso numa manobra de antecipação do governo que acabou por anular a manifestação agendada para 7 de Março [7], e um ano depois foi espancado [4] por milícias pró-regime em Cazenga.

Viagem no tempo dos Ritmos de resistência

Ao mesmo tempo, a música da resistência angolana das décadas de 50 e 60 foi homenageada num encontro organizado pela associação sem fins lucrativos Centro Interculturacidade [8] em Lisboa, no início de Junho. Celebrando a presença de Amadeu Amorim, que integrou os históricos N'Gola Ritmos [9] [en], e numa viagem ao passado da música de intervenção, o blog Interculturacidade apresenta [10] o conjunto musical da seguinte forma:

motor da ideia de independência de Angola, e por isso perseguido. desmantelado e com vários dos seus elementos presos. Amadeu esteve longo tempo no Tarrafal e mais tempo esteve o líder do conjunto, Carlos Liceu Vieira Dias.
Numa entrevista publicada [12] no blog Nós Por Cá, de Silvia Milonga, em 2002, Amadeu Amorim explica “o que era o N’gola Ritmos no contexto social e político” de então:
No fundo, era uma rebelião pacífica, tentando despertar consciências adormecidas, que não acreditavam em mais nada, eram 500 anos de colonização. Não havia televisão, nem rádio para toda gente, os jornais não chegavam aos musseques nem ao interior do país e nós sabíamos que uma canção ficava presa no assobio, no cantar. Na LNA quando cantávamos em kimbundu, as pessoas viravam a cara meias envergonhadas, chamavam-nos os mussequeiros. Algumas pessoas no meio daquela malta que estavam acordadas, entediam porque cantávamos em kimbundu, mais tarde outros apareceram a dizer que falavam ou cantavam em kimbundu. Chegamos a rádio Esperança, uma rádio que transmitia de Brazaville, ouvida às escondidas. A nossa canção era a única que existia, as pessoas ouviam a rádio e o N’gola Ritmos, passando a mensagem de que não chegamos ao fim, vamos começar agora.
Continue a ler aqui.

Angola: Rhythms of Resistance, Past and Present


Sara Moreira wrote this brilliant article for Global Voices Online, examining how music has played such an important part in the resistance movements of the Angolan people, both in the late 60s and early 70s as well as right now. It reminded me a bit of an article I wrote a couple of years ago highlighting the charged political leanings of Lusophone hip-hop. Sara's article puts the spotlight on the persecution and violent repression of the movement that has recently been protesting against Dos Santos' three-decades-old rule; the most prominent people in this movement, it turns out, are invariably musicians. It's therefore inevitable that parallels are drawn between the repression of pro-independence musicians back in the 70s. Read on:

Angola: Rhythms of Resistance, Past and Present
by Sara Moreira

On 24 May, 2012, Amnesty International reported [1] that as the August elections in Angola approached, intimidation and violence against freedom of speech was expected to escalate, including that against political musicians. The report called for a full and impartial investigation into a violent attack against a group of anti-government activists, which included rapper Hexplosivo Mental [2].

Two weeks later, on June 11, another artist, known for his open opposition to the government, Luaty Beirão, also known as Ikonoklasta or Brigadeiro Mata Frakuxz, was arrested [3][pt] at the airport of Lisbon, for allegedly carrying cocaine in his luggage. On social media, many people commented that the real reason behind #Ikonoklasta [4]'s detention was political. In recent times, the rapper's voice of dissent has become more and more visible, as he openly lent support to the frequent street protests in Luanda where dissidents have been holding demonstrations to voice discontent with the government of President José Eduardo dos Santos [5], who has been in power for 33 years now.

Previously, Luaty had been arrested in March 2011, in a preemptive maneuver [6] by the government which resulted in the cancellation of the proposed large-scale, anti-government demonstrations scheduled for March 7,2011. One year later he was attacked [3] [pt] by pro-regime militias in Cazenga.

Time travelling to other ‘rhythms' of resistance


In a journey to another time of Angolan music of resistance, the historical group N'Gola Ritmos [7] from the 50's and 60's, was honored by the non-profit association Centro Interculturacidade [8] [pt] in Lisbon, in the beginning of June, 2012. Celebrating the presence of Amadeu Amorim, one of the members of N'Gola Ritmos [7], blog Interculturacidadepaid [9] [pt] a tribute to the group, which was described as:

Motor da ideia de independência de Angola, e por isso perseguido. Desmantelado e com vários dos seus elementos presos. Amadeu esteve longo tempo no Tarrafal e mais tempo esteve o líder do conjunto, Carlos Liceu Vieira Dias.

(Force behind the idea of independence in Angola, and thus persecuted, dismantled, and several of its members arrested. Amadeu was long time in Tarrafal [prison camp [11] in Cape Verde] - and the leader of the group, Carlos Liceu Vieira Dias, (was in prison) even longer.)


In an interview published [12] [pt] on the blog Nós Por Cá, by Silvia Milonga in 2002, Amadeu Amorim explained “what N’gola Ritmos stood for in the social and political context” back then:
No fundo, era uma rebelião pacífica, tentando despertar consciências adormecidas, que não acreditavam em mais nada, eram 500 anos de colonização. Não havia televisão, nem rádio para toda gente, os jornais não chegavam aos musseques nem ao interior do país e nós sabíamos que uma canção ficava presa no assobio, no cantar. Na LNA quando cantávamos em kimbundu, as pessoas viravam a cara meias envergonhadas, chamavam-nos os mussequeiros. Algumas pessoas no meio daquela malta que estavam acordadas, entediam porque cantávamos em kimbundu, mais tarde outros apareceram a dizer que falavam ou cantavam em kimbundu. Chegamos a rádio Esperança, uma rádio que transmitia de Brazaville, ouvida às escondidas. A nossa canção era a única que existia, as pessoas ouviam a rádio e o N’gola Ritmos, passando a mensagem de que não chegamos ao fim, vamos começar agora.
Basically, it was a peaceful rebellion, trying to awaken dormant consciences, who did not believe anything else, seeing the 500 years of [Portuguese] colonization. There was no television or radio for everyone, the newspapers did not reach the slums or the interior of the country and we knew that a song stayed stuck in a whistle, in singing. In the LNA [Angolan National Liberation] when we sang in Kimbundu, people turned their face half ashamed, they called us ‘mussequeiros' [a mention to people from the slums, musseques in Portuguese]. Some people amidst those guys who were awake, understood why we sang in Kimbundu, others showed up later saying that they spoke or sang in Kimbundu. We made it to Esperança (Hope) Radio, a radio broadcast of Brazzaville, heard in secret. Our song was the only one that existed, people were listening to the radio and to N'gola Ritmos, the message saying that we hadn't come to an end, we are just starting, was in the loop.

Read the rest of the entry here. // Continue a ler aqui.


Wednesday, June 27, 2012

Podcast Zarpante: Caipirinha Lounge é convidado


For the reader that has kept coming back to this website in vain expecting some sort of update (it's been three weeks now), this podcast is for you!

I did this podcast at the behest of Henrique from Zarpante, the Lusophone crowdsourcing and crowdfunding internet initiative. You'll notice their logo further down on the page under "Partnerships". The proposed them was the new generation of Angolan artists, a topic I am only too happy to talk about. Choosing which artists to speak about was relatively easy; I love talking about them to anyone who makes the mistake of listening to me, and the conversation flows easily.

It's my first podcast so excuse the quality, the fact that my voice dips considerably in volume on the second half of this podcast, and so on, but the music on show is excellent and the next one can only get better.

Occupy youself with the songs listed below, all of them available for download separately here on the Lounge:

1. Coca o FSM – O Ano Q Vem
2. Coca o FSM – Só Sou Fara Ninguém Acreditou
3. Aline Frazão – Olhar Adiante
4. Aline Frazão – Primeiro Mundo
5. Leonardo Wawuti – Sintam-se
6. Leonardo Wawuti – Entre Mim e o Eu
7. Keita Mayanda – Existência
8. Keita Mayanda – A Idade da Razão
9. Nástio Mosquito – Bebi Beberei Bebendo
10. Nástio Mosquito – Não sei se vou te amar \

You can download this podcast directly from the Soundcloud box below. I hope you enjoy it!




A ti leitor, que ainda visitas o site a procura em vão de qualquer update, já lá vão três semanas, dedico este podcast a ti! 

Fiz este podcast após um convite do meu amigo Henrique da plataforma Zarpante, parceira do Lounge. O tema proposto foi a nova sonoriade angolana, um tema que, diga-se de passagem, adoro. Escolher os artistas foi fácil – há muito que gosto de falar sobre eles, e a conversa sai fluidamente.

Este é o meu primeiro podcast – a qualidade não é lá grande coisa, a metado do podcast o volume da minha voz baixa considerávelmente, mas a música está excelente e vá-lá, vou aprendendo e da próxima sai melhor!

Deliciem-se com as músicas dos seguintes artistas, todas elas disponíveis aqui no Lounge:

1. Coca o FSM – O Ano Q Vem
2. Coca o FSM – Só Sou Fara Ninguém Acreditou
3. Aline Frazão – Olhar Adiante
4. Aline Frazão – Primeiro Mundo
5. Leonardo Wawuti – Sintam-se
6. Leonardo Wawuti – Entre Mim e o Eu
7. Keita Mayanda – Existência
8. Keita Mayanda – A Idade da Razão
9. Nástio Mosquito – Bebi Beberei Bebendo
10. Nástio Mosquito – Não sei se vou te amar

Podem fazer o download directamente da barra do Soundcloud. Espero que gostem!

Wednesday, June 6, 2012

"O álbum começa no domingo e termina no sábado": Parte III



As we begin the third stage of our journey, we'll skip over Nomes, Rimas e Palavras, which has been featured here before, and we arrive at two of the most solid tracks on the album. They feature two of heavyweights of the moden Angolan music scene: Paulo Flores and Bruno M. Featuring an artist of Paulo Flores’ stature is a major coup for someone like MCK, who, not too long ago, considered it too unsafe to even show his face in public and is still the subject of covert regime persecution. Perhaps Paulo Flores participation will help certain people get rid of some of their “misconceptions” regarding freedom of speech in music. From Paulo and Kapa’s collaboration spawned the beautiful song Nzala, a composition that highlights the precarious, shameful living conditions of an embarrassingly large part of Angola’s urban and rural population.

Kamama ou Kuzu is another standout in this album. Camama is the name of a famous prison in the outskirts of Luanda, while kuzu is slang for being imprisoned. In the song, Katro and Bruno M rap that “there are only two options: Kamama or Kuzu”. Much is said about Angolan kuduro but very little is said, internationally at least, about Bruno M, perhaps Angola’s most lyrically evolved and most socially-conscious kuduro artist. He’s in fine form on this one, equally adept spilling verses over a hip-hop beat as he is on a kuduro track; after all, there are many bridges between these two disparate but urban-born musical genres. Even if you don’t understand Portuguese, you can appreciate the delivery…

Bonus Track:

If you heard Bruno M and liked what you hear, there’s more. I mentioned above that he’s one of the most innovative kuduro artists working in Angola, and one that has positively surprised me; the lyrics of his kuduros read like social manifests, and his deft wordplay betray an uncommon intelligence rarely seen in this genre, which relies mostly on exhibitionism and materialism. A friend of mine called Bruno M’s music “conscious kuduro”, comparing to the conscious hip-hop movement. Take a listen to Por Cada Lágrima; when has kuduro been done like this before?


Nzala
Kamama ou Kuzu

Bonus Track:
Por Cada Lágrima


Ao começarmos a terceira etapa deste nosso perípelo pelo novo álbum do Katro, saltamos o Nomes, Rimas e Palavras, que já foi antes aqui postado, e chegamos então a dois dos mais fortes brindes do disco. As duas músicas contam com dois convidados de peso: Paulo Flores e Bruno M, dois artistas em grande forma musical. Ter um Paulo Flores no seu disco de certeza foi um grande momento para o Kapa; afinal de contas, não era há muito tempo que o Katro era persona non grata no panorama musical angolano. Aliás, ainda o é, mas a participação do Paulo talvez ajude algumas pessoas a despirem certos preconceitos. Da sua colaboração saiu uma canção linda, a Nzala, que relata o sofrimento e a dura realidade de um pedaço vergonhosamente largo da nossa sociedade.

Kamama ou Kuzu é outra que me faz carregar no repeat..."caminhos são dois, Kamama ou Kuzu." Está música mostra-nos um Bruno M em grande forma, eloquente, inteligente, com um rap deslumbrante e incisivo. Que prazer ouvir-lhe. Demonstra mais uma vez as pontes entre o kuduro e o rap...o mano até parece um natural. O Kapa, como é hábito, dispensa comentários. A letra, os versos dos dois, são para ser ouvidos várias vezes e com atenção.

Bonus Track:

O Bruno M é um dos melhores kuduristas em Angola, e com certeza o que mais me surpreende. As letras dos seus kuduros são manifestos sociais e de uma inteligência invulgar no mundo materialista e exibicionsitas do kuduro. Um amigo chamou-o, e muito bem, de kuduro consciente. Uma escuta ao Por Cada Lágrima o dirá porquê: quando é que já se fez kuduro assim?



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